quarta-feira, 9 de julho de 2014

O Mito da Doença

 O Mito remonta os antigos povos gregos que na necessidade de explicarem o inexplicável criavam histórias e narrativas utilizando muita simbologia, personagens sobrenaturais ou não, deuses e heróis. O mito tinha como objetivo transmitir conhecimento e explicar fatos através de rituais e cerimônias, danças, sacrifícios e orações. Através de um mito pode-se ter a manifestação de alguma coisa de forma forte ou a explicação de temas desconhecidos. O Mito nem sempre é utilizado na simbologia correta, porque também é usado em referência às crenças comuns que não tem fundamento objetivo ou científico. 
Segundo Freud os mitos são uma expressão simbólica dos sentimentos e atitudes inconscientes de um povo. O Mito do Complexo de Édipo foi utilizado por Freud para explicar a atração sexual do filho, na primeira infância,  pela  mãe com o desejo de suplantar o pai.
O mito pode também ter origem a partir de um estado comportamental de uma pessoa ou grupo (povo) que a partir desse novo padrão cria-se uma nova história, que vai influenciar uma nova cultura e formatar novas atitudes aos povos descendentes dessa situação.
Platão em sua obra “A República”  faz uma narrativa, onde o leitor é convidado a imaginar uma caverna onde existem humanos que ali  nasceram e cresceram sem nunca terem saído para o mundo fora dessa caverna por estarem presos e acorrentados. Na porta dessa caverna existe um grande muro que separa os dois mundos , o de dentro e o de fora da caverna. Os homens existentes no mundo exterior mantêm uma fogueira acesa e os ruídos por eles produzidos podem ser ouvidos dentro da caverna. Da mesma forma suas sombras são projetadas para as paredes internas da caverna. Os seres humanos acorrentados vêem as sombras e pensam que elas são realidade. 

Platão pede em seguida que se imagine que um dos homens acorrentados consegue escapar e fugir passando o muro e alcançando o lado exterior onde ele percebe que as sombras antes vistas vinham de homens como ele. Além disso, descobriu também a natureza que existia do outro lado do muro.

Platão discursa então sobre o que esse homem fará com essa nova realidade e o que poderá acontecer se ele resolver voltar para a caverna, contando aos outros que a vida que estão vivendo é na realidade um engano. Poderá acontecer que os outros homens o ignorem completamente, ou no pior dos casos, que o matem, por considerarem que ele é um louco ou mentiroso.

Através desta alegoria, Platão nos remete para a situação que muitos seres humanos vivem, num mundo de ilusão, e presos por crenças errôneas, preconceitos, idéias falsas, e por isso vivem em um mundo com poucas possibilidades, assim como os homens na caverna.
Platão usou essa narrativa para explicar como o ser humano pode obter libertação da escuridão com a ajuda da luz da verdade, falando também da teoria do conhecimento, do conceito de linguagem e educação como alicerces de um Estado Ideal. Contudo, é importante perceber que indivíduos que procuram espalhar a luz e a verdade - como o homem que regressara à caverna - são muitas vezes mortos. Esse foi o caso de Sócrates, que foi condenado à morte, depois de ter sido acusado de corromper a mente dos jovens.Essa narrativa é conhecida como o Mito da Caverna e serve muito bem para explicar o comportamento do ser humano perante a uma situação inesperada ou de difícil aceitação ou conhecimento.

O Mito devido  sua riqueza simbólica quando corresponde à um comportamento, serve para ampliar o conteúdo afetivo, emocional e também o comportamental.  Isso é o que acontece no que tange às situações onde a doença é o objeto do mito. Algumas doenças, mais graves, de difícil tratamento ou mesmo cura, como AIDS ou diversos tipos de Câncer, produzem uma reação comportamental muito semelhante ao Mito da Caverna aqui comentado. Vou chamar essa situação de Mito da Doença. A desinformação acerca de uma doença grave, onde não se sabe se existe a cura ou não para o portador da mesma, se assemelha ao muro que separa os dois mundos exterior e interior da caverna na narrativa de Platão. O indivíduo que observa o doente (a partir desse ponto denominarei somente observador) na verdade está vendo a “sombra projetada” e não sabe até onde ela é real ou não. Em função dessa dúvida, o observador não se aproxima do ser doente, por várias razões : Medo de se contaminar, medo de falar sobre algo que não domina, medo de produzir uma reação inesperada do doente, medo de não ser bem recebido pelo doente. O medo de não saber o que vai acontecer remete o observador ao para um mundo de ilusão, conforme narrou Platão. Normalmente, as pessoas próximas daquelas doentes, em sua maioria, procuram obter informações do doente não diretamente dele, mas sim através de um parente ou amigo. Quando criam coragem de fazer um contato seja pessoal ou virtual, já se passou muito tempo desde que a doença foi descoberta. Da mesma forma que os homens acorrentados dentro da caverna, o ser doente, estará em uma situação muito mais confortável se receber do observador atenção e acesso a uma relação próxima, sem ilusões, preconceitos, idéias falsas. O doente, devido ao seu estado, carece de afetividade e carinho daqueles que o cercam. O afastamento pelo Mito da Doença causa grande tristeza ao doente que tem a sensação de abandono daqueles que gosta ou ama.

A cura de uma doença passa por vários processos e um deles é o restabelecimento da autoconfiança na própria pessoa de que ela ficará saudável. O afastamento das pessoas próximas, por puro Mito da Doença, não contribui em nada para esse restabelecimento. As pessoas doentes devem ser encaradas, como o homem que escapou da caverna e viu que no mundo exterior a realidade era outra. As pessoas doentes não devem ser tratadas como sombras. As pessoas doentes querem afeto, carinho, conforto, aproximação, diálogo. Falar sobre a doença com um doente não vai entristecê-lo mais ainda, muito pelo contrário, vai permitir que ele se desabafe, que alivie a pressão interna, que ele saia da caverna. Não devemos fazer um Mito de qualquer doença que seja, pois nela não há o inexplicável, não há personagem sobrenatural.

Mesmo chamando esse estado comportamental de Mito da Doença, na verdade esse mito não existe. É uma falsa ilusão baseada em preconceitos, medo e desinformação. Belo Horizonte, 01 de julho de 2014.

Ana Tereza Veloso Costa - Psicóloga

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